Encorpado

Autor: João Pedro Maciel Schlaepfer

todo corpo é orgânico mecânico
todo corpo é uma cidade esférica e esburacada
todo corpo é a lua de uma estrela
que de buraco em buraco se constrói
que de porta em porta fica sem saída

a cidade é um corpo em obra constante
as empresas, corpos edificados
na fumaça do centro e dos carros
e do ônibus que você pegou
você cheira tua blusa, teu corpo
você vê que você se fuma
você fuma teu cartão
você fuma teu estagiário
você fuma teu chefe, teu número, teu endereço
você fuma teu e-mail, teu número de telefone
você fuma teu cargo e tua logo
você enche o peito
e não acende um cigarro
pra matar a fome na hora do almoço
você volta na condução
com a condição de sentir toda a fome de um cidadão
escutando por alto o que sai dos templos que você construiu
encontrando corpos e ideias
subindo ladeira na contramão da fé
que é vendida nas esquinas, nos bares, cafés
nos ônibus, corpos, celestes
é tudo vendido sem nota e sem garantia
porque a fé prescinde propaganda
e o mau uso do dízimo dizima a diferença
aí, você almoça teu orgulho
com fome, com doce
com lama, perdão
almoça pra alimentar o corpo orgânico mecânico
cidade esférica e esburacada
lua de uma estrela
que de buraco em buraco se constrói
que de porta em porta fica sem saída

o homem todo funciona corpo
o corpo funciona todo homem
todo corpo homem funciona
homem funciona o corpo todo
todo corpo funciona, homem