Entre a história e a História inconfidentes



por Isadora Schwenck

Cecília Meireles, ao passear pelas ruas de Ouro Preto, Vila Rica e São João D’El Rei, sentiu as paredes pulsarem a História daqueles lugares. Ela própria explicou, na Conferência apresentada na Casa dos Contos, no 1º Festival de Ouro Preto, em 20 de abril de 1955 – que inclusive consta em algumas edições do “Romanceiro da Inconfidência” - por que decidiu não permanecer surda e alheia às vozes que ela escutava entre os monumentos históricos mineiros. Sentiu a necessidade de contar a essência da terra do “Libertas Quæ sera tamem”, ideal que parece simbolizar não somente Minas Gerais, mas também o Brasil. “Liberdade, ainda que tardia!”, os inconfidentes queriam gritar. Grito que não chegou a se concretizar, porém seus vestígios continuam a ecoar na História brasileira.

O "Romanceiro da Inconfidência", conjunto de oitenta e cinco poesias, narra história dessas Minas Gerais do século XVIII tingidas pelo ouro, pela ambição e movidas pela vontade compartilhada de serem livres. Queriam o direito de prosperar sem a intervenção de Portugal. 

“Liberdade, ainda que tardia”: essa era a vontade de uma elite letrada que era influenciada principalmente por Voltaire e Montesquieu e a independência norte americana. Porém, o que se percebe é que a Inconfidência Mineira foi um movimento menos regido pela liberdade política e ideológica do que pelos próprios interesses pessoais de seus membros. Tiradentes, até todo o movimento ser descoberto e desfeito, apenas obedecia às ordens dessa elite. A elevação do alferes a herói só ocorreu pela personalidade dele, que não denunciou os líderes do movimento e assumiu toda a culpa, motivo desconhecido até hoje. 

Com o “Romanceiro da Inconfidência” em uma mão e “A Devassa da Devassa – A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal (1750-1808)” em outra, enxergo todos os ingredientes que fazem da Inconfidência Mineira uma história tão importante de ser contada. A obra do brasilianista Kenneth Maxwell costura os fatos detalhadamente, partindo da situação político econômica de Portugal e chegando ao Brasil do ouro e da ambição, passando pelas origens da Inconfidência e seu declínio, fechando no crescimento da produção açucareira brasileira. 

A poesia de Cecília Meireles, por outro lado, constrói com sentimento, narrativa e lirismo a história do povo brasileiro, misturando a verdade histórica à aura das tradições e da lenda. Assim, esquadrinho essa poesia de cunho social, resgatando Cecília do cenário literário brasileiro e aprendendo a perceber como se constrói um romanceiro – percepção que contribui para a consolidação de uma cidadania.

Isadora Schwenck cursa Tradução e, no PET, faz uma pesquisa sobre o Romanceiro da Inconfidência, de Cecília Meireles, orientada pela professora Eliana Yunes.

Obras de referência:
MAXWELL, Keneth. A devassa da devassa: A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal (1750-1808). 2 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
MEIRELES, Cecília. Romanceiro da Inconfidência. 2 ed. Rio de Janeiro: Nova fronteira, 1989.